Conheci a música de Itamar Assumpção nos idos de 2003, o ano de sua morte. Foi na casa do meu amigo Igor Zargov, ouvindo uma coletânea de arquivos mp3 gravados. Lembro que foi um tempo de abertura da minha mente para artistas que não eram da "elite" da música popular brasileira, como o Tom Zé e o Arrigo Barnabé, mas que me arrebataram com um sentimento de gostoso estranhamento.
À época não consegui ter a dimensão do Itamar, que ainda não estava tão falado como hoje, ainda mais aqui em Goiânia, onde poucos conheciam sua obra. De fato, senti logo de cara que era um artista bastante singular, que eu nunca tinha ouvido nada igual. Com o tempo li mais sobre sua trajetória e descobri o contexto histórico em que estava inserido, do que ficou conhecido como a Vanguarda Paulistana.
Neste fim de semana assisti ao documentário Daquele Instante em Diante, na mostra Iconoclássicos, que está sendo exibida aqui em Goiânia pelo Cine Cultura. Me emocionei muito com o filme, com seus depoimentos e imagens reveladoras sobre a personalidade e a arte de Itamar. Suas neuras sobre seu lugar na história da nossa música, que já se podia perceber em suas letras, é revelada ainda maior em várias entrevistas, assim como sua inflexibilidade, mas ao mesmo tempo aparente frustação, de não alcançar o sucesso comercial através da indústria do disco vigente na época e em meios como o rádio e a televisão.
Não me ficou claro até onde ele resistia ou não era aceito pelo mercado. Isso o marcou por toda a carreira, tanto que em seus discos finais e póstumos muitas letras fazem referência a este conflito. Rogério Skylab discorre num texto muito interessante sobre o lugar de Itamar, algo entre o experimentalismo radical de Arrigo e as experiências no campo da canção que Luiz Tatit e o Grupo Rumo empreendiam. Ele era experimental, radical, mas esteve sempre inserido na tradição da canção popular brasileira, negando-a mas seguindo seus preceitos, numa antítese que depois se tornaria aos poucos mais sintética em seus discos com a banda Orquídeas Selvagens e no disco em que recria a obra de Ataulfo Alves.
Ao ouvir os discos de sua Caixa Preta e agora vendo este sensível documentário constato algo que parecia, nas palavras de muitos dos colegas e amigos entrevistados no longa, uma destino inescapável obra de Itamar, a posteridade. Bem, não posso dizer se isso realmente é o que querem os artistas, a glória em vida em detrimento do esquecimento póstumo, ou o contrário. O fato é que o interesse e fascínio pelo Nego Dito só estão aumentando e não devem parar tão cedo. Eu estou incluido ai, pois o conheci logo após sua morte e como o próprio nome do filme diz, daquele instante em diante só aumentou meu interesse e admiração.
Longa vida à música de Itamar Assumpção, Benedito Santo Silva Beléléu, vulgo Nego Dito, Nego Dito Cascavel!
Assista ao documentário Daquele Instante em Diante, que a propósito deve ser reprisado no Cine Cultura amanhã ou depois.